Cartoon de Vitor Teixeira
Já na ditadura de 1964, pensou-se na modernização sem povo e sem cultura. Os intelectuais naquela ocasião foram tratados como perniciosos. Vários professores e cientistas tiveram que emigrar, processando-se inesperado e paradoxal brain-dain de uma economia periférica.
O governo pós-64, além da castração do desejo, procurou esterilizar o ambiente cultural, como se estivesse empenhado na devastação do ecossistema da literatura.
A revolução cultural comandada pelo poder pós-64 procurou atar a realização intelectual ao mercado. As universidades e o ensino de modo geral foram perpassados pelo pragmatismo da eficiência produtiva, da Contabilidade Social, de tal sorte que as cifras de crescimento econômico se tornaram prioritárias a toda e qualquer formação de relevo humanístico.
Os cursos de Letras e de Ciências Sociais foram afetados pela carência de recursos e de apoio, para que fabricasse o novo homo braziliensis, de corte epicurista, um sub-produto do consumismo internacional.
O cidadão brasileiro, modernizado pela informática e pela parafernália das técnicas de comunicação, foi sendo esvaziado de suas aspirações reflexivas ou emotivas.
Muitos escritores autênticos ficaram submetidos a uma sujeição vexatória, pois a indústria cultural funcionou em harmonia com a ditadura, atirando uma cultura banalizada sobre a massa amorfa e banindo as expectativas favoráveis a uma produção local.
Tanto a excitação dos desejos do público, quanto o atendimento das necessidades deste foram previstos tão-somente para que o brasileiro cumprisse as suas básicas funções de animais, de tal sorte que o sonho de riqueza do homem comum inclui apenas a capacidade de morar, vestir e comer bem. Nenhum bem cultural se admite na cesta-base do consumo conspícuo.
O homo braziliensis reproduzido pela máquina modernizadora do governo pós-64 ficou vazio de interesses culturais. Bibliotecas, exposições de arte, espetáculos de dança, teatro, produção massiva de livros e revistas, enfim, todas as formas de refinamento da expressão artística não foram mantidas no horizonte de aspirações públicas como prioritárias, segundo o planejamento socioeconômico posto em execução. Na verdade, sequer constaram como atividades suplementares. Foram deslocadas para significar meramente formas ornamentais da vida.
Extraída a dimensão política do cidadão, pouco restou para a área estética da cultura. Retirado ao cidadão o acesso à consciência de si, ele ficou encarcerado, sem força objetiva para se libertar, pois somente na prática política a sua consciência se desdobraria em ação libertadora.
O governo pós-64, além da castração do desejo, procurou esterilizar o ambiente cultural, como se estivesse empenhado na devastação do ecossistema da literatura.
A revolução cultural comandada pelo poder pós-64 procurou atar a realização intelectual ao mercado. As universidades e o ensino de modo geral foram perpassados pelo pragmatismo da eficiência produtiva, da Contabilidade Social, de tal sorte que as cifras de crescimento econômico se tornaram prioritárias a toda e qualquer formação de relevo humanístico.
Os cursos de Letras e de Ciências Sociais foram afetados pela carência de recursos e de apoio, para que fabricasse o novo homo braziliensis, de corte epicurista, um sub-produto do consumismo internacional.
O cidadão brasileiro, modernizado pela informática e pela parafernália das técnicas de comunicação, foi sendo esvaziado de suas aspirações reflexivas ou emotivas.
Muitos escritores autênticos ficaram submetidos a uma sujeição vexatória, pois a indústria cultural funcionou em harmonia com a ditadura, atirando uma cultura banalizada sobre a massa amorfa e banindo as expectativas favoráveis a uma produção local.
Tanto a excitação dos desejos do público, quanto o atendimento das necessidades deste foram previstos tão-somente para que o brasileiro cumprisse as suas básicas funções de animais, de tal sorte que o sonho de riqueza do homem comum inclui apenas a capacidade de morar, vestir e comer bem. Nenhum bem cultural se admite na cesta-base do consumo conspícuo.
O homo braziliensis reproduzido pela máquina modernizadora do governo pós-64 ficou vazio de interesses culturais. Bibliotecas, exposições de arte, espetáculos de dança, teatro, produção massiva de livros e revistas, enfim, todas as formas de refinamento da expressão artística não foram mantidas no horizonte de aspirações públicas como prioritárias, segundo o planejamento socioeconômico posto em execução. Na verdade, sequer constaram como atividades suplementares. Foram deslocadas para significar meramente formas ornamentais da vida.
Extraída a dimensão política do cidadão, pouco restou para a área estética da cultura. Retirado ao cidadão o acesso à consciência de si, ele ficou encarcerado, sem força objetiva para se libertar, pois somente na prática política a sua consciência se desdobraria em ação libertadora.
É uma tradição em nossa cultura nacional que o espaço político seja defeso ao cidadão, pois a instância associativa é propositadamente erigida sobre um cipoal de condições que tornam mera abstração o esforço de emancipação ou de militância política.
O que pode fazer o escritor durante os anos de repressão foi produzir uma revanche intelectual, uma espécie de fuga ou de má consciência, enquanto o brasileiro, na sua qualidade de trabalhador, ia sendo paulatinamente devolvido à esfera da escravidão. Continuou escravo como etimologicamente se entende a palavra: sob "clava", debaixo de ferro, sem meio de aspirar à liberdade, emparedado entre as condições irremovíveis, diante da opacidade do caminho emancipador. Está imóvel entre ser consciente e ser prisioneiro, adotando no máximo uma consciência estática, pois desprovida de ação.
Tudo corresponde a um plano global de despolitizar o homem brasileiro e retirar-lhe a consciência de seus direitos de cidadania.
A ditadura pós-64 preocupou-se em construir muita coisa, mas não deixou o Brasil crescer no sentido cultural.
A cultura, rebaixada a indústria, empurra a obra literária para os mecanismos de sucessibilidade, de permutabilidade e de transitoriedade, de tal modo que ela se vê prisioneira de uma sarabanda em que tudo é perecível. Ficou, assim, sufocada a velha aspiração de se eternizarem na história dos povos os instantes de plenitude.
Assistimos, no terreno da cultura literária, a um constante deslocamento para a insignificância. Os próprios veículo de comunicação de massa colaboram com isto. A mística da novidade mata todo e qualquer esforço de atualização e releitura do passado literário.
Criou-se, em substituição à aura que acompanhava o texto literário, um sucedâneo publicitário de excitação da massa semi-letrada, uma estridência que se manifesta nas listas de vendagens. O saber vulgar, transformado em opinião pública, serve de padrão avaliador do trabalho artístico.
Vivemos, ainda neste momento, a era da cultura como fanfarra, um subproduto da cultura gramaticalizada, ou seja, da sociedade hipercodificada, comprimida nos princípios da ordem, das normas e das regras, fundada em metatextos, leis, manuais. Isto significa que ficou longe da cultura textualizada, isto é, daquela baseada nos textos em que o mundo e a história se dão a conhecer.
A condição de escravo não se define apenas pelo ato de obedecer, diante da imposição vexatória, mas também pela adoção de valores consagrados, que são construções ideológicas.
Fábio Lucas