Pular para o conteúdo principal

O Gado Patriótico


À Caserna! À Caserna!

Vai, jovem de vinte anos, mecânico ou professor, pedreiro ou desenhista, deita no leito...

... No leito de Proscuto.

Tu és demasiado pequeno... vão te alongar.

Tu és demasiado grande... vão-te encurtar.

Aqui é a caserna... ninguém se faz de esperto; aqui não se fanfarrona... todos são iguais, todos são irmãos... Irmãos em quê? Em estupidez e obediência, ora bolas.

- Ah! Ah! Tua pessoa, tua cabeça, tua forma! Não damos a mínima para isso. Teus sentimentos, teus gostos, teus pendores, ninharias.

É para a Pátria... dizem-te.

Não és mais um homem, és um carneiro. Estás na caserna para servir à pátria. Não sabes o que és, pior para ti. Por sinal, não precisas sabê-lo. Só tens de obedecer. Cabeça erguida. Cabeça à esquerda. Mãos na fileira. Descansa! Come! Bebe! Dorme!

Ah! Falas de tua inciativa, de tua vontade. Aqui não conhecemos isso; aqui só há disciplina.

O quê? O que estás dizendo? Que te ensinaram a raciocinar, discutir, formar-te um juízo sobre os homens e as coisas? Aqui fica calado; cala a boca. Não tens, não deves ter outras apreciações, outros juízos senão aqueles de teus chefes.

Não queres, não podes seguir senão aqueles dos quais reconhecestes a competência após a experiência? Sem piada aqui, meu rapaz. Tens um meio prático para saber a quem obedecer... Contra as divisas douradas que estão na manga de um dólmã.

O que ainda tens a dizer? Ensinaram-te a não ter um ídolo, a não adorar nada? Não importa, curva teu corpo, beija o solo, obedece respeitosamente, é o símbolo da pátria, o ídolo do século XX, o ícone democrático. Isso, meu amigo, é a forma republicana do estandarte de Joana d'Arc.

Vamos, deixa teu espírito, tua inteligência, tua vontade na porta... Tu és gado... pedem-te apenas lã...

Entra... e não pensas mais.

À Caserna! À Caserna!

***

O exército, eu dizia ultimamente, não se ergue em face do inimigo do exterior; o exército ergue-se em face de nós próprios; em face de nossa vontade, de nosso "eu".

O exército é a revanche da multidão contra o indivíduo, do número contra a unidade.

O exército não é a escola do crime; não é a escola da orgia; ou, se e tudo isso, é o menor de seus defeitos; o exército é a escola da obediência, é a escola da covardia, é a escola da emasculação.

Malgrado a família, malgrado a escola, malgrado a oficina, resta um pouco de sua personalidade em cada homem; de tempos em tempos, movimentos de reação produzem-se contra o meio. O exército, cuja caserna é o local, vem concluir essa obra de aniquilação do indivíduo.

O homem de vinte anos tem essa virilidade generosa que lhe permite consagrar-se ao desenvolvimento de uma ideia. Ele não tem os entraves do hábito, os desencorajamentos do lar, o peso dos anos. Pode esticar sua lógica até a revolta. Ele tem, nele, a seiva pronta para fazer despontar os botões e desabrochar as flores.

Na curva da estrada, colocam-lhe a armadilha da Pátria, a armadilha do Exército, a ratoeira da Caserna. Então, todas as faculdades são anuladas. Não é mais necessário pensar. Não é mais necessário ler. Não é mais necessário escrever. Em nenhum caso deve-se ter vontade.

Desde a ponta dos cabelos até àquela dos pés, todo o vosso corpo pertence ao exército. Vós não escolheis mais o chapéu nem o calçado que vos agrada. Não portais mais vosso pão menos ou mais assado. Não dormis mais quando tende sono... Há um calçado, um chapéu, uma veste obrigatória. O pão é feito em fornadas comuns e a hora de vosso descanso é fixada há anos.

O que é isso? Questão de resistência!

Mas eis o pior... Na rua, não falais com quem quiserdes! Não entrais no local que vos agrada! Não ledes o jornal que vos interessa! Vossas frequentações, vossos encontros e vossas leituras também estão sujeitas ao regulamento!

E se, por acaso, sois tomado por perturbações sexuais, há o bordel dos soldados e aquele dos oficiais, como também há locais diferentes para alcoolizar.

Tudo está regulado, tudo está previsto. O indivíduo é assassinado. A iniciativa está morta.

***

A Caserna é o estábulo do gado patriótico. Ele sai de lá um rebanho pronto a formar o gado eleitoral.

O Exército é o instrumento temível erguido pelos governantes contra os indivíduos; a Caserna é a canalização das forças humanas de todos em proveito de alguns.

Entra-se ali homem, torna-se ali soldado, dali se sai "cidadão". 

Albert Libertad

1875 - 1908


Postagens mais visitadas deste blog

Why am I not christian

As falsas previsões proféticas apenas têm o poder sobre aqueles que foram condicionados a crer sem base na evidência e sobre aqueles segundo o nível de instrução é espantosamente carente de teoria materialista. É como se um rei arcaico falasse e suas palavras mostrassem como verdadeiras, seja como ordens, bênçãos ou maldições que poderiam fazer acontecer, magicamente, o que elas tendem a demonstrar. Acredita-se por medo a constatação imperativa da profecia paterna que remete ao obscurantismo e ao domínio subjetivo e ao triunfo geográfico ou a "experiência divina" revela o conformismo absoluto que está implícito. Em ambos os casos, a fragilidade dos crentes que concordam sem resistência extrai a crueldade do representante (muitas vezes um semi-letrado) em extrair satisfação, vaidade e dinheiro da ilusão, ou seja, de enriquecer e ganhar poder por meio da mentira.

Socialism and religion

Present-day society is wholly based on the exploitation of the vast masses of the working class by a tiny minority of the population, the class of the landowners and that of the capitalists. It is a slave society, since the “free” workers, who all their life work for the capitalists, are “entitled” only to such means of subsistence as are essential for the maintenance of slaves who produce profit, for the safeguarding and perpetuation of capitalist slavery. Religion is one of the forms of spiritual oppression which everywhere weighs down heavily upon the masses of the people, over burdened by their perpetual work for others, by want and isolation. Impotence of the exploited classes in their struggle against the exploiters just as inevitably gives rise to the belief in a better life after death as impotence of the savage in his battle with nature gives rise to belief in gods, devils, miracles, and the like. Those who toil and live in want all their lives are taught by religion to be sub...

Educação nacional

  A educação brasileira é tão atrasada que não serve como instrumento de combate à superstição. Não tem como objetivo geral formar intelectuais. Veja por exemplo a expressão e a experiência que o subdesenvolvido tem com as suas cidades. Herança do iluminismo mandou um abraço.