Na aldeia de Montaillou, durante as perseguições medievais, os inquisidores pediram que uma mulher dissesse de quem tinha tirado suas dúvidas heréticas sobre inferno e ressureição. Ela deveria saber que corria o terrível perigo de uma morte lenta nas mãos dos devotos, mas respondeu que não as tinha tirado de ninguém, e sim chegado a elas por conta própria. (Você frequentemente ouve os crentes louvarem a simplicidade de seu rebanho, mas não no caso dessas espontâneas e conscientes sanidade e lucidez, cujos autores foram reprimidos e queimados em número maior do que somos capazes de imaginar.
Vivemos numa era de charlatões? Já se disse muitas vezes que escritores possuem sensibilidade particular para as mudanças culturais de seu tempo. Portanto, a publicação em língua inglesa, nos últimos anos, de dois romances intitulados Charlatans – um de Robin Cook, outro de Jezebel Weiss – pode ser um sinal de alerta de que isso esteja acontecendo. Talvez esses livros sejam um aviso para que tomemos cuidado com esses indivíduos que, em número crescente, prometem o que não podem cumprir, arrogam-se qualidades que não possuem ou oferecem produtos nada confiáveis, como notícias falsas, remédios suspeitos e trapaças online. A lista desses mestres da ilusão (para usar uma expressão bem-educada) pode incluir também alguns evangelizadores, curandeiros e políticos, bem como, convém não esquecer, certos intelectuais. O que explica a proliferação dos charlatões em nosso tempo? Uma das respostas possíveis é que ela resulta das pressões e da sedução exercidas pelos meios de comunicação, sobretudo ...