A Renda Básica de Cidadania constitui um redesenho fundamental dos mecanismos de distribuição de renda. E a ideia é bastante simples: todo residente legal em um território recebe uma renda suficiente para viver acima da linha da pobreza sem precisar trabalhar ou dar qualquer outra contribuição. Há um aumento de imposto para dar conta da RBC, então mesmo que todos ganhem essa renda, os que recebem mais se tornaria contribuintes diretos (e, portanto, o aumento dos impostos seria maior do que a renda básica recebida). Os programas públicos já existentes, que visam dar apoio financeiro às pessoas, seriam eliminados - exceto aqueles conectados a necessidades especiais (ligados a pessoas com deficiência). Leis referentes ao salário mínimo também deixariam de ser necessárias, já que não haveria razões para proibir contratos voluntários com salários baixos, considerando que as necessidades básicas teriam sido atendidas pela RBC. E ela também poderia ser calibrada em algum nível apropriado para crianças, ao menos em comparação aos adultos.
A maioria das defesas da RBC afirma que a renda básica eliminaria a pobreza, reduziria a desigualdade e avançaria em direção à justiça social. Essas são, sem dúvida, questões importantes. Se a renda básica for razoavelmente generosa, isso poderia ser um passo significativo em busca de um ideal igualitário, visando prover para todos igual acesso às condições materiais necessárias para uma vida plena. Porém, no contexto atual, há uma consequência adicional importante para a RBC: num mundo em que ela existisse, as pessoas poderiam se engajar mais facilmente em iniciativas em prol da construção de novas relações econômicas e sociais. Um dos fundamentos do capitalismo é que a maioria dos adultos precisam de um emprego remunerado para poder saciar suas necessidades. Por sua vez, as medidas testadas de programas de transferência de renda, comuns em Estados de bem-estar social, conseguiram mitigar um pouco dessa necessidade, mas ainda assim era difícil para as pessoas dizerem "não" ao mercado de trabalho capitalista. A RBC pode tornar isso mais fácil e abrir um novo conjunto de possibilidades para as pessoas.
Outra vantagem é que a RBC iria constituir transferência massiva de recursos para as artes, permitindo que as pessoas possam optar por uma vida centrada em atividades criativas, em vez de se preocupar com as rendas geradas pelo mercado. E vejam, isso ocorreria sem a necessidade de pesados controles administrativos, de definições estatais de prioridades para o campo (por meio de bolsas e subsídios), ou até mesmo sem um viés focado nas fundações mais elitistas das artes. A renda básica pode garantir a sobrevivência de pequenos agricultores sem a necessidade de subsídios governamentais - que geralmente beneficiam muito mais o agronegócio que a agricultura familiar. A RBC também criaria uma potencial aliança de poetas e camponeses, que entrariam em atividades dentro e fora do mercado não mais em estado de vulnerabilidade, mas sim, em segurança.
A RBC também seria uma forma de apoiar as pessoas que cuidam de familiares que estão fora do mercado.
A Renda Básica de Cidadania pode, portanto, ser considerada um dos alicerces centrais para a construção de uma economia socialista e democrática, e não simplesmente uma forma de reduzir os males do capitalismo.
Erik Olin Wright
1947 - 2019