No corpo do alcoólatra habituados a substâncias temperadas estão instaladas e sedimentadas as partes voláteis dos aromas. Imputrescíveis, elas marcam a carne, fazem dela matéria explosiva. Beber álcool é transformar-se em álcool e, portanto, arriscar-se a explodir se as condições se apresentarem. A leitura sumária do real, a teoria dos fluidos e a dos humores hipocráticos provocam ilusões substancialistas e animistas que os higienistas, dietistas, médicos e cientistas, agindo de par com as autoridades políticas, mais ou menos voluntariamente exploram um terreno ideológico.
Vivemos numa era de charlatões? Já se disse muitas vezes que escritores possuem sensibilidade particular para as mudanças culturais de seu tempo. Portanto, a publicação em língua inglesa, nos últimos anos, de dois romances intitulados Charlatans – um de Robin Cook, outro de Jezebel Weiss – pode ser um sinal de alerta de que isso esteja acontecendo. Talvez esses livros sejam um aviso para que tomemos cuidado com esses indivíduos que, em número crescente, prometem o que não podem cumprir, arrogam-se qualidades que não possuem ou oferecem produtos nada confiáveis, como notícias falsas, remédios suspeitos e trapaças online. A lista desses mestres da ilusão (para usar uma expressão bem-educada) pode incluir também alguns evangelizadores, curandeiros e políticos, bem como, convém não esquecer, certos intelectuais. O que explica a proliferação dos charlatões em nosso tempo? Uma das respostas possíveis é que ela resulta das pressões e da sedução exercidas pelos meios de comunicação, sobretudo ...