Somos bombardeados regularmente com relatos extravagantes de UFOs divulgados por publicações sensacionalistas, mas é raro ouvirmos algo sobre a sua merecida reprovação. Isso não é difícil de compreender: o que vende mais jornais e livros, o que acumula ibope mais elevados, o que é mais divertido de acreditar, o que repercute mais os tormentos de nosso tempo - naves alienígenas acidentadas ou trapaceiros experientes pilhando os crédulos? Extraterrestres de imenso poderes brincando com a espécie humana, ou o fato de esses relatos se originarem de fraquezas e imperfeições humanas?
Sempre me impressionou o modo como a questão é formulada, a sugestão de que não se trata de um problema de evidência, mas de crença. Nunca me perguntaram: "É de boa qualidade a evidência de que os UFOs são espaçonáveis alienígenas?".
Descobri que a atitude crédula de muitas pessoas é bastante predeterminada. Algumas serão convencidas de que o depoimento de testemunhas oculares é confiável, de que as pessoas não inventam histórias, de que são impossíveis alucinações ou brincadeiras em tão grande escala, e de que só pode haver uma conspiração governamental de alto nível e longa duração para nos manter ignorantes da verdade. A credulidade a respeito dos UFOs se nutre da desconfiança difundida contra o governo, que nasce muito naturalmente de todas aquelas circunstâncias em que - na tensão entre o bem-estar público e a "segurança nacional".
As bandeiras de alerta contra a falsificação se agitam. Como são elevadas as recompensas da falsificação no mercado de arte, os colecionadores devem ser muito cautelosos.
Há muitos casos na história humana de natureza semelhante - em que de repente aparece um documento de procedência dúbia, trazendo informações de grande importância que confirmam vigorosamente as ideias dos que o descobriram. Depois de uma investigação cuidadosa e, em alguns casos, corajosa, comprova-se que o documento é uma mistificação. Não é difícil compreender a motivação dos mistificadores. Um exemplo mais ou menos típico é o livro do Deuteronômio - descoberto escondido no templo de Jerusalém pelo rei Josias, que, milagrosamente, em meio a uma importante luta por reformas, encontrou no Deuteronômio a confirmação de todas as suas ideias.
Carl Sagan
1934 - 1996