Do iluminismo ao cientificismo, procederá à desmistificação da fé, dissolvendo os mitos ao explicá-los, do mesmo modo que Édipo fez desaparecer a Esfinge ao resolver seu enigma.
A história do ateísmo não é somente a do epicurismo, do ceticismo libertino, do materialismo iluminista, do marxismo, do niilismo e de algumas outras teorias intelectuais. É também a história de milhões de seres humildes, imersos em suas tarefas cotidianas, preocupados demais com a simples necessidade de sobreviver, a ponto de nem sequer questionar os deuses. O ateísmo prático, em geral negligenciado, é a fachada existencial da descrença, tão fundamental quanto sua fachada nobre, teórica. Os dois polos do ateísmo são dois extremos da atitude para com o divino; como todos os extremos, opõem-se, completam-se e ligam-se; eles balizam as diferentes nuances do sentimento religioso, absorvendo por cima e por baixo os refratários ao divino, os inimigos dos deuses, os militantes do pensamento livre, assim como os decepcionados e os indiferentes às religiões. Essas duas franjas extremas sempre existiram, ocupando um espaço maior ou menor, conforme as circunstâncias, os valores dominantes e a atitude das próprias religiões.
Mas o ateísmo não é somente uma atitude de recusa, rejeição ou indiferença, que só poderia ser definido em relação às religiões. Ele é tambe´m uma atitude positiva, construtiva e autônoma. Como de costume, contrariamente aos pressupostos da historiografia religiosa, o ateu não é aquele que não crê. O ateu crê também - não em deus, mas no homem, na mulher, na matéria, na razão. Em cada civilização, o ateísmo contribui com algo.