Dom Dadeus Grings anuncia, em tom solene: "morreram mais católicos do que judeus no holocausto, mais isso não aparece porque judeus têm a propaganda do mundo".
Qual ser humano que pensa, com prudência, assimilaria a sentença do bispo ao mútuo conhecimento e apreço? Se, como afirma o pastor de Porto Alegre, os judeus são os donos da propaganda mundial (na era nazista, eles eram acusados, além daquele defeito, de serem os monopolistas das finanças planterárias), sua fala e seus atos entrariam no terreno da mentira, da plena dissimulação tendo em vista o engodo. Apreço? A frase do antístite, além de caluniosa, retoma litanias que finalizaram em Auschwitz e outros campos do inferno, anunciados na dantesca Noite dos Cristais.
Mas o sofisma, subjacente à calúnia, é ainda mais cruel: "morreram mais católicos do que judeus no holocausto". Dom Grings aprendeu, no seminário, parece, as lições de lógica tomista. A definição deve conter o definido, e apenas o definido. Ela deve ser precisa, evitar a generalização, ser própria e não confundir o definido com uma de suas espécies; ela deve ser positiva. A "morte", na sentença episcopal inclui, ao mesmo tempo, as ocorridas na guerra e no genocídio. Os soldados, no açougue das potências européias, foram dirigidos para o morticínio porque defendiam ou atacavam interesses de governos. Civis assassinados entram nos cálculos monstruosos dos dirigentes. Dado importante: dos soldados de Hitler, apenas sete católicos se declararam contra as batalhas, por motivo de consciência. Tiveram os católicos a oportunidade de mostrar o pacifismo. Instruídos pelos bispos germânicos, em 1933, eles seguiram o Führer e se colocaram "à sua disposição de todas as formas". Morte em guerra e morte em genocídio são realidades distintas, que devem ser definidas de modo rigoroso.
O bispo de Porto Alegre, Dom Dadeus Grings, acha que não foram mortos seis milhões de judeus, mas "apenas" um milhão. Santo homem! Ele retorna aos velhos tempos anteriores ao Vaticano II, quando na missa se rezava "pelos pérfidos judeus".
Roberto Romano